28 de janeiro de 2011

POLÍCIAS - TERMÔMETRO DA DEMOCRACIA

 Ronilson de Souza Luiz

   "Do rio que tudo arrasta se diz violento, mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem.” (Bertold Brechet)

   Visível e, no entanto, desconhecida, familiar e, todavia, estranha, protetora e, apesar de tudo, inquietante: a polícia inspira nos cidadãos das democracias modernas sentimentos ambíguos, resumidos nessas três oposições. Mas, antes de mais nada, o que é polícia? É assustador o elevado número de pessoas que desconhecem, por completo, minimamente como funciona o aparelho policial, quanto aos modos de organização e o controle externo a que está submetido. Trata-se de uma constatação reveladora, porque se os pesquisadores e críticos de plantão não estão familiarizados com as rotinas mínimas de um posto policial, de uma companhia operacional de policiamento e de uma delegacia de polícia ou não têm paciência e tempo para estudá-los -como podem comentá-los? Já é tempo de nossos sociólogos, cientistas políticos, antropólogos, enfim os pesquisadores das ciências humanas, se darem conta de que não tiveram a coragem necessária de mergulharem no emaranhado, à Michel Foucalt, que envolvem os aparelhos dos funcionários responsáveis por fazerem cumprir a lei.
   Há certamente uma relação direta entre a crítica ferrenha e as trevas do desconhecimento no que se refere às questões mínimas de polícia. Cabem a esses críticos a opção de que a esperança do mundo pode estar na revolta, que, etimologicamente, significa "dar meia volta", passando a dar às polícias o devido valor e relevância. Por isso, é importante que sejam divulgados os excelentes trabalhos realizados nas Unidades Escolas da Polícia Militar, a saber: Centro de Formação de Soldados, Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças, Escola de Educação Física, Academia de Polícia Militar do Barro Branco e Centro de Aperfeiçoamento e Estudos Superiores, espaços de treinamento e formação, o que implica em gestão democrática e práticas curriculares participativas, propiciando a constituição de redes de formação contínua, cujo primeiro e mais importante enfoque é a formação dos soldados.
   Quando os debatedores falam em violência, devemos ter em conta, que implica intencionalidade, o que exige inteligência: razão pela qual os irracionais não são violentos, mas ferozes. Ninguém se iluda, todavia. Temos ante nós tarefa muito e muito difícil. Até porque, em sua célebre obra O mal-estar na civilização, como em outras, Freud procura demonstrar-nos que o processo civilizatório é intrinsecamente repressivo, o que põe a violência como constitutiva das civilizações.
   É papel fundamental do pesquisador abordar questões preementes ao funcionamento mínimo da vida, porém, o que notamos são teses e dissertações a cerca dos mais variados temas exceto sobre as polícias. Espero que o brilhante material disponibilizado pelo NEV- Núcleo de Estudos da Violência- USP, via Edusp, com patrocínio da Ford Fundation, possa despertar a importância que tem as polícias, hoje, no cenário mundial.
   Ao educador policial-militar e aos professores da Polícia Civil e Científica cumprirá como foi ensinado por Buber, propagar que o encontro humano coroa um momento de graça no qual havia alguém batendo pelo lado de fora, bem como havia alguém querendo abrir, pelo lado de dentro da porta.
   Como não existe ser humano apolítico, pois que nem os omissos logram sê-lo (omitir-se é também tomar posição política), principalmente o policial-educador deve ser alguém politizado; isto não significa que, como formador de opinião, ele esteja nomeado doutrinador das massas,  porém é fundamental que tenha consciência de que a atuação da polícia é de fato o termômetro do grau da democracia de um povo. Portanto, salvando-nos do naufrágio individualista, será necessário que voltemos a  conceber a vida como um complexo de interdependências, como a grande arena das fragilidades humanas necessitadas da solidariedade mútua. E lembremos, relendo a epígrafe, que nenhum tempo é tempo de desistir.
Inteligência Policial

Ronilson de Souza Luiz
Há uma charge provocativa aos policiais que diz: “inteligência policial – duas palavras
contraditórias”.
Com certeza, o policial exerce poder, mas com a mesma certeza se constata que, em torno e
sobre ele, outros poderes se exercem, em um incrível jogo de estratégias. Eis a primeira vista um
paradoxo, mas que de fato é parte de um mesmo sutil mecanismo: o policial é poderoso e, ao
mesmo tempo, e na mesma intensidade, “não possui poder algum”; ele serve de instrumento para
que outros poderes sejam exercidos e, é nesse jogo, justamente, que a inteligência policial se
mostra vigorosa.
É certo, pois, que se trata de um ofício; ser, hoje, policial em qualquer local, mas não de um ofício
qualquer. É um ofício que dói, e no qual muito se arrisca.
A pergunta então é:____ o que é inteligência policial?
É investir na formação contínua do policial, do Soldado ao Coronel, valendo para a Polícia Civil e a
Científica.
A inteligência policial exige que o patrulheiro observe a regra, e que identifique-se com ela, e que
esteja sistematicamente atento à irregularidade – quando os outros, ao contrário, baseiam-se nas
regularidades.
Tenho dito que quanto mais qualificado for o corpo docente das instituições policiais melhores
serão os futuros policiais, consequentemente, teremos melhor prestação de serviço.
Certamente, seguindo exemplos possíveis de serem aplicados em nossa realidade, com
integração e parceria junto as Universidades que contam com institutos de pesquisa que abordem
questões ligadas a atividade policial.
Fica aqui a grande dica ao presidente que venceu e aos governadores eleitos e reeleitos, ou seja,
a atividade policial-militar que é essencialmente preventiva; repressiva apenas no limite, exige
treinamento e formação permanente.
Lembrando que a cultura ainda não conhece melhor prevenção do que o esclarecimento e o
diálogo, frutos de uma boa educação.
A atividade policial por ser essencial, emergencial e diuturna necessita sobremaneira formular
hipóteses, construir caminhos, tomar decisões, em bom tempo a sociedade percebeu que urge
investir nas polícias, e o ditado por ser rancoroso, provará ser inverídico.
Minha contribuição: a propagada inteligência policial é afirmar que ela será alcançada por meio do
investimento no objeto descrito abaixo, adaptado da obra
Ofício de escrever.
“É uma máquina bem inventada: tem pouco peso, cabe no bolso, não consome energia ( não
necessita pilhas, nem tomadas, nada ), é descartável ou guardável, conforme a conveniência, usa
se em qualquer lugar (uma praia , um trem, o metro, a sala de espera do dentista).
Ele pára quando queremos, podemos voltar para trás, repetir, pular vários capítulos, conhecer o fim
desde o início, tomar notas, folhá-lo, deixá-lo na mesa da cabeceira por meses a fio, retomá-lo de
repente como se nunca tivéssemos tido em mãos algo tão prazeroso, mantê-lo aberto sobre os
joelhos, dormir com ele no colo, oferecê-lo a quem não dispõe de instrumento eletrônico algum,
com a segurança de que será plenamente desfrutado, ele pode abarcar todo o universo do
conhecimento e da sensibilidade humana”.
Todo mundo escreve para que a sociedade mude e é o modo como interrogamos o mundo que se
renova sempre.
Não caminhando por esta trilha tornaremos o ditado que abre o texto verídico.
Por tudo isso não posso deixar de cumprir também este dever pedagógico, como educador policial
militar, de esclarecer as idéias e colocar ordem no pensamento, acreditando que tudo que
escrevemos com facilidade é normalmente difícil de se ler.
Ronilson de Souza Luiz,40, Oficial da Polícia Militar do Estado de São Paulo, Professor
Universitário, Doutor e Mestre em Educação na PUC/SP, Bacharel e Licenciado em Letras
pela USP, Instrutor no Centro de Formação de Soldados. Email - profronilson@gmail.com

O MILITAR E O MILITANTE

O MILITAR E O MILITANTE
 Ronilson de Souza Luiz
   Militar é aquele que segue a carreira das armas, que serve nas Forças Armadas, relativo a mílicia, significando também estar filiado a um partido, seguindo e defendendo as idéias de um grupo político, lutando, opondo-se.
   Na religião romana da Antiguidade, há um deus chamado Janus, sempre representado por uma cabeça com dois rostos opostos, de modo a olhar para frente e para trás; essa divindade era considerada protetora dos começos, isto é, da hora inicial do dia e do primeiro mês do ano (Januarios).
   Recentemente, os novos Ministros foram levados para conhecerem a outra face de Janus. Meu maior desafio é mostrar a outra face da Polícia Militar. A situação é delicada, considerando o ensinamento do pesquisador Thomas Szasz: "o profissional que escolhe ser um membro leal à sua profissão tem, então, de abraçar a ideologia da profissão: vai ensiná-la, aplicá-la, refiná-la e distribuí-la tão amplamente quanto possível, e, acima de tudo, vai defendê-la contra aqueles que a atacarem. Já o profissional que escolher ser um pensador crítico, este vai examinar cuidadosamente a ideologia: vai analisá-la; examiná-la histórica, lógica e sociologicamente; vai criticá-la, e, portanto, vai destruí-la como ideologia".
   Somos em alguns momentos chamados de radicais. Alerto que é a parte boa da história, pois, radical é aquele que vai a raiz dos fatos e dos problemas ao ponto invariável, portanto essencial, fixando por meio de laços morais e consolidando-se. Meus adversários de diatribe, parte deles, caminhavam rumo ao radicalismo, desconhecem que militar e militante têm muitas similaridades; e que todo militar já é um militante, porém, com algumas especificidades, certamente a mais forte são as tradições calcadas em costumes seculares.
   Sabiamente, a legislação não permite que os militares se filiem a partidos políticos, estabeleçam sindicatos ou façam greves, tudo porque militamos por valores que transcendem o cenário político, prova disso é que, sejam quais forem os resultados das discussões sobre o que ocorrerá com a previdência, em nada irão alterar nossa prontidão. Não que isso seja um mérito inalcansável por outros grupos, apenas, de forma ímpar, nos diferenciamos por fazermos renúncias que outros jamais pensariam. Aceitar os descaminhos, fazer o trabalho crítico do pensamento sobre o próprio pensamento, explorar o que pode e deve ser mudado no próprio pensamento - esse é um exercício dificílimo, porém, absolutamente necessário, ensinou o filósofo Michel Foucault.
   Saibam os militantes que o verdadeiro comandar não consiste unicamente em dar ordens, mas também em despertar  nos subordinados um desejo de colaboração voluntária. Existem duas maneiras de manejar os homens. Uma consiste em reprimir um ato indesejável pela força, pelo medo ou pela punição: é o método direto, com o qual se conforma o militar que não se sente seguro de suas aptidões. A outra, de uso mais delicado, requer tato, paciência, espírito compreensivo, uma aptidão especial para tratar os homens no plano da sinceridade intelectual e da igualdade; com exclusão de toda procura de popularidade, visa substituir a repressão pelo encorajamento e desenvolver em cada homem o melhor de si mesmo.
   Para que vivo? Que lição devo tirar da vida? A essas perguntas, o militante  responde apressadamente: para me tornar um bom cidadão, um erudito ou um comerciante. Mas o militar que é previdente e está voltado para criar uma cultura autêntica com ideais nobres deve responder: para me elevar e produzir os grandes homens e mulheres que a sociedade necessita.
   Aos fervorosos críticos dos militares e de seus herdeiros diretos que somos nós, policiais militares, encerro com a sabedoria chinesa "se dois homens vêm andando por uma estrada, cada um carregando um pão, e, ao se encontrarem, eles trocam os pães, cada homem vai embora com um; porém, se dois homens vêm andando por uma estrada, cada um carregando uma idéia, e, ao se encontrarem, eles trocam idéias, cada homem vai embora com duas".

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