4 de fevereiro de 2011

Pesquisador, adote um policial!


Pesquisador, adote um policial
O caminho para que a atividade policial, consequentemente, a segurança pública, possa ser repensada e rearticulada passa oportunidade de seus integrantes analisarem suas práticas e suas formas de conceberem os fenômenos sociais, e a pós-graduação tem esse condão.
O resultado da história da polícia escrita pelos “de fora”, todos conhecem. Creio que ficaram surpresos ao ouvirem os relatos da polícia vista, descrita e pensada pelo público interno.
Talvez, nem todos os pesquisadores saibam, mas, se observarmos, nenhum outro órgão público tem o alcance do aparelho policial para descrever as realidades em todo o Estado. O policial, que é o braço armado do Estado, é o único servidor presente em todos os nossos mais de 600 municípios.
Clamo aos pesquisadores que adotem um policial. Esta será sua valiosa contribuição e postura de senso democrático.
A atividade policial permite pesquisas que vão desde a Educação até a Saúde Pública, passando pelo Direito, Administração, Psicologia, Antropologia, Sociologia, Filosofia, Serviço Social; até Engenharia.
Cito como exemplo, minha pesquisa que trata da formação do soldado em um novo regime político-social. Agradeço o incentivo do Coronel PM Rubens Casado, comandante do policiamento em toda a Capital e que iniciou sua brilhante carreira como Soldado.
Alerto para as vantagens de se ampliar o ciclo que é formação, estágio e atuação, com um período de análise dessa formação e avaliação do curso.
A idéia é que o recém-formado retorne aos bancos escolares a fim de repensar e discutir seu processo formativo. Agora este profissional terá condições de avaliar o corpo docente que participou de sua formação e dinamizar o sistema, agindo também como crítico do sistema.
As vantagens são que teremos uma atualização mais dinâmica no processo formativo, ou seja, aquilo que o policial estará aprendendo na academia estará em fina sintonia com o que ocorre nas ruas em termos de linguagem, modus operandi, locais de maior incidência criminal, os deslocamentos de delitos e outras informações atualizadíssimas, realimentariam o circuito.
O grande desafio a implementá-la é que teremos que trocar este pneu com a aeronave em pleno vôo, porém, não tenho dúvidas que somos capazes.
As pesquisas não têm obrigatoriamente que se converterem em roteiros de propostas para aplicação imediata, no entanto, nada impede-as de ser; e quando isso acontece demostra o compromisso social do pesquisador.
Tudo isso foi possível graças a abordagem que tem o excelente Programa de Pós-Graduação em Educação-Currículo, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, no qual destaco o Professor Doutor Antonio Chizzotti, meu orientador, que percebeu a oportunidade ímpar de colaborar com o sistema democrático, apontando caminhos a este futuro mestre.
Pesquisadores, lembrem-se de que embaixo daquela farda que você vê no homem e mulher há um ser desejante de conhecimentos, e com um leque enorme de perguntas que poderão ser objetos de pesquisa nunca antes trabalhadas.
Um simples e inquietante exemplo: todos já devem ter visualizado um policial à noite, ao lado de sua viatura, com o luminoso “giroflex” ligado. Pergunto quais as conseqüências desta exposição a longo prazo na acuidade visual do policial e como minimizá-la?
Quem ganhará com este tipo de investigação : todos.
A polícia terá em seus quadros profissionais melhor qualificados que, naturalmente, redundará em serviços com qualidade superior, o que na ponta da linha gerará melhor atendimento aos nossos solicitantes.
Acredito como Foucault que é possível àquele que faz parte da engrenagem apontar com melhor precisão suas falhas e corrigi-las.
Pesquisadores, não tenham dúvidas, seus policiais discípulos serão dignos continuadores das virtudes de seus mestres.
Um raciocínio similar a este processo é aquele que apostava no fato de que, quem não possuísse um diploma, jamais poderia governar esta Nação.
Oxalá meus anelos e minhas aspirações possam concretizar-se.


Ronilson de Souza Luiz, 40, Oficial da  Polícia Militar do Estado de Paulo, Doutor e Mestre em Educação na PUC/SP, Bacharel e Licenciado em Letras pela USP, Instrutor no Centro de Formação de Soldados e colaborador na Universidade da Cidadania Zumbi dos Palmares.
Publicado no Recanto das Letras em 29/12/2006
Código do texto: T331608

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